sexta-feira, 29 de abril de 2011

     
Era 2010 e ela, aos 70 anos, ali experimentando a cena. Tinha uma força e potência revelada poucas vezes, e a malícia quase velada da sua turma em geral. A cena criada por todos e praticamente ditada pelo espaço fazia livros dançarem e suas histórias aleatórias serem lidas ao acaso. Foram dois encontros com o público. Dias depois, todos juntos revendo o percurso, ouvimos dela: "Eu não sei ler, né? Aí, quando a gente abria o livro pra ler pro público, eu ia contando uma história minha, que eu inventava." Por dentro, silêncio de alguns instantes, pegos de surpresa pelo que desconhecíamos e encantados com a sutileza da solução.
Era 2011 e quase 4 meses depois. Volta o processo; ela não está. Uma colega sua: "Ela não vem mais. Foi pra escola à noite, decidiu que queria aprender a escrever o nome, porque ela não sabia ler nem escrever, né? Aí resolveu ir aprender."
                 

sexta-feira, 22 de abril de 2011

  
                  
branco retorno . pés no chão . reencontro . corte outro e outros . vinho água . tempo espera . cheiro . ritual . linda verdade intensa . chão cantos vozes condensadas . água nos olhos . suor observação .
  
um de novo que é sempre diferente, visualizo vontades e guardo flores de olhos fechados preenchidos de devir.
      
                  

sábado, 9 de abril de 2011

              
sonhei que eu ia e a mala era esquecida no taxi do aeroporto eu descia só com uma mochila muito pesada e não me dei conta que o volume maior tinha ficado no carro coração apertado com a viagem-risco a velocidade era essa, corri pelos corredores para procurar o taxista que quando achei jogava com os outros umas sacolas-minha-mala, papéis escritos do lado de dentro na sacola de supermercado eu de olho no relógio meu horário e o vôo a mala era recuperada depois porque o motorista era amigo de alguém que não me lembro como uma indicação, eram roupas para quinze dias que o inconsciente sabia serem meses, na verdade, sem prazo.
          

sexta-feira, 8 de abril de 2011

                         
Horror. Crianças. Olhos estalados: tornamo-nos irremediáveis?
Revirada com isso tudo. Como dormir??

Tenho visto muitas referências ao referendo de 2005, e relembrei um texto que escrevi nessa época. Reli e não pareceu preciso mexer em nada - e já se passaram quase 6 anos. Compartilho novamente.

Essa história do referendo me fez pensar em algumas coisas.
Ainda que pareça uma votação deslocada (num momento de investigações múltiplas sobre corrupção e outros terrores...), o fato é que agora, de uma maneira ou de outra muita gente comenta o assunto.
O que me deixou bastante assustada nos últimos dias foi a profusão de inclinações para o "não" que passei a ler e escutar. Então, a solução para um país onde os índices de violência só aumentam é armar oficialmente a população? Começam a aparecer piadas e analogias a determinados momentos políticos em que os governos desarmaram a população para evitar revoluções populares. Sinceramente? Antes estivesse o povo brasileiro organizado para esse fim! Me parece justamente o contrário: ter uma arma aparece agora como símbolo de segurança individual (proteja seus bens, sua família, sua integridade) sem que se perceba que essa falsa sensação de proteção só aumenta o perigo e afasta o homem da humanidade.
Tudo poderá ser justificado como legítima defesa: o menino encostou no vidro do carro, o motorista atira. Aí os outros motoristas, bastante solidários, compram a briga: inúmeras mortes em nome da segurança. Ouve-se um barulho na porta de casa, atira-se. O assaltante reage - normalmente bem mais preparado -, alguém da família leva um tiro. Tudo em nome da paz. Adolescentes estúpidos da alta burguesia já queimaram mendigos, agora com acesso livre às armas a brincadeira pode ficar mais prática para eles. "Os bandidos saberão que a população está desarmada, eles se sentirão livres para agir". Ora, quanta ilusão pensar que o número de assaltos e crimes será reduzido se grande parcela da população estiver armada para "assustar o ladrão". Quem vive do crime não vai deixá-lo por medo do cidadão armado. Isso me parece extremamente claro. Imagino o número de homícídios e balas perdidas crescendo em progressão geométrica à medida que todo cidadão resolva exercer o seu direito à defesa.
Há alguns dias vi um morador de rua encostado em um poste, pele e osso (não deve sobreviver ainda muitos dias), já completamente fora de si pelos efeitos todos da miséria, conversando num telefone imaginário algum assunto importantíssimo. Falava com extrema verdade segurando um objeto que lhe parecia muito real. A cena era impressionante. É ao que está sendo reduzida a humanidade: miséria, alucinação e descaso. Aí sim começa a violência. E não é armando a população que se vai combater suas causas - nem aliviar suas consequências "temporariamente". Logo mais estaremos saindo às ruas armados até os dentes, montados em tanques de guerra, ao invés de ônibus, carro ou metrô. Assim estaremos mais seguros.
Ter direito a ter uma arma é ter direito de usá-la. É ter o direito de matar em nome do fim da violência. Nada me soa mais incoerente.

17 de outubro de 2005
            

terça-feira, 5 de abril de 2011

        
limiar linha tênue ponto de fusão abismo de vento
o (meu) tempo pertence a?
desenho pequeno, passível de invisibilidade, registrado na pele, ainda não
um piercing virtual no canto da orelha
frio abraçado entre taças tintas
passagem de ar passagem de ar
mais paciência (in)tolerante
sonhos que atravessam o mar
ou a rua
...e se eu quisesse estar em outro lugar?